Os 2 anos e 5 meses do bebê, internado em coma e desenganado na Santa Casa de Campo Grande, não foram de uma vida estável. Mesmo assim, garotinho demonstrava nem ligar para o que lhe faltava, como em foto que congelou o tempo no momento em que os olhos do pequeno são espremidos por sorriso espontâneo.
O clique que circula nas redes sociais mostra o menino feliz, apesar da camiseta maior que o corpinho e dos chinelos improvisados. O cenário é uma calçada de cimento de uma casa simples, assim como era o imóvel onde ele viveu os últimos dias, no Jardim Colibri, região do Bairro Universitário, em Campo Grande.
O endereço foi um dos muitos pelos quais o bebê e a irmã mais velha, de 4 anos, passaram na companhia da mãe, de 19 anos, e do padrasto, de 24. A família vivia em situação de rua, dormindo em imóveis abandonados e até numa Kombi deixada em via pública, afirmou a delegada Nelly Macedo, responsável por investigar o que levou o garotinho ao coma por traumatismo craniano com perda de massa encefálica.
Em coletiva de imprensa, na tarde desta quinta-feira (1º), ela relatou certa dificuldade para a investigação descobrir onde o pequeno havia sido machucado de tal maneira, uma vez que o casal, agora preso por suspeita de espancar a criança, não tinha morada fixa.
Há alguns dias, pelo muro dos fundos, ao lado de obra inacabada, a família havia invadido residência à venda no Colibri. Os vizinhos não sabiam. Quem conversou com a reportagem no bairro diz que via a mãe com as crianças pelas ruas, mas não fazia ideia que ela estava dormindo no imóvel fechado.
Para a polícia, foi ali, naquela casa com paredes de madeira, cercada de mato alto e outros sinais evidentes de abandono, que o garotinho teve seus últimos minutos de consciência.
Detalhes do que aconteceu no interior do imóvel não são conhecidos ainda. Mãe e padrasto insistem em versões de que o pequeno foi vítima de acidente – contaram 3 histórias diferentes até agora –, mas a perícia passou pelo local e a investigação descartou essa hipótese.
Além disso, segundo a delegada, as marcas no corpo do bebê falam: ele foi vítima de violência.
Evidências – Para comprovar a teses, a responsável pelo inquérito espera o resultado dos laudos periciais, mas já juntou outras evidências, dentre elas as imagens das câmeras de segurança de um comércio localizado na rua onde fica a casa invadida e que mostram a movimentação logo após o ocorrido.
Conforme descrição que a reportagem teve acesso, tudo aconteceu por volta das 11h, isso porque vídeo mostra o momento que o padrasto aparece inquieto, correndo na rua com a criança nos braços e a mãe vem logo atrás, puxando a filha mais velha pela mão. Então, o homem volta para a residência abandonada e passa de novo, apressado, desta vez, carregando os pertences do casal e das crianças numa mochila. Aliás, era tudo o que a família tinha. “O que eles tinham mesmo era para passar poucos dias”, descreveu a delegada durante a coletiva.
Mãe e padrasto andaram por cerca de 2 minutos até pararem em frente a uma igreja para pedir o socorro, por telefone. “Há imagens deles correndo com a criança para que não fosse identificado local do fato”, afirmou Nelly Macedo.
O Corpo de Bombeiros foi chamado, mas o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) enviou ambulância. Para a equipe de socorristas, o casal contou que a criança havia caído ali mesmo, no meio da rua. No hospital, já sem o marido, a mãe disse que o acidente havia acontecido numa escada pequena, na porta de casa. Por último, já na delegacia, apareceu a versão de queda do muro.
Fato é que o menino deu entrada na Santa Casa de Campo Grande, às 13h31 de uma terça-feira, dia 23 de janeiro, inconsciente. Tinha o trauma na cabeça, acúmulo de líquido e hematomas no abdômen, lesões no pulmão e fígado, além de escoriações nas pernas. Médica que o atendeu viu ali sinais de maus-tratos e acionou a PM (Polícia Militar).
O bebê já não tem reflexos. Nesta quarta-feira (31), a avó materna foi avisada pelos médicos sobre o protocolo de morte encefálica, o segundo aberto desde a entrada do garotinho no hospital. O primeiro, finalizado no início desta semana, foi inconclusivo. O menino teve mais uma chance, mas não reagiu, conta a avó. A morte é dada como certa, lamentou a mulher de 44 anos.
Prisões – Na manhã de hoje, a mãe e o padrasto foram presos por tentativa de homicídio. Os mandados de prisão expedidos são temporários, com duração de 30 dias.
A reportagem tentou contato com o proprietário do imóvel do Jardim Colibri, mas pelo telefone o corretor que o representa disse apenas que não tinha "nada a informar" e nem quis passar o número do cliente.