O barulho das colheitadeiras sufoca o som da natureza de Bonito, um dos principais destinos do ecoturismo do Brasil. A vegetação nativa tem diminuído acentuadamente para abrir espaço para lavouras de grãos.
Apenas na bacia hidrográfica do rio da Prata, uma das sub-bacias de Bonito, a cobertura vegetal caiu praticamente pela metade em três décadas e a agropecuária atinge 70,5% da região. Em todo o município, a área plantada com grãos cresceu 26% desde 2014, seis vezes mais que o incremento em Mato Grosso do Sul no mesmo período.
Com a saturação das áreas das principais regiões produtoras, as lavouras se expandem para municípios diversos do estado. É nesse processo que aumenta o plantio de grãos em Bonito. “Muitos proprietários de Bonito estão arrendando terras para produtores rurais de outras regiões, como de Maracaju”, diz o coronel da PMA (Polícia Militar Ambiental), Ângelo Rabelo, especialista em conservação ambiental e fundador do IHP (Instituto Homem Pantaneiro).
O problema mencionado por Rabelo não é recente, mas está se intensificando, tornando mais crítico o nível de degradação ambiental de Bonito, município sul-mato-grossense mundialmente conhecido por seus rios com águas cristalinas, cavernas, cachoeiras e outras tantas características naturais, que fazem jus a seu nome.
Mapeamento da PMA de uso da terra e cobertura vegetal na região mostra avanço expressivo do desmatamento para introdução de atividades agropecuárias.
De acordo com o levantamento, na bacia do rio da Prata, as atividades agropecuárias ocupavam, em 1986, área correspondente a 57,93% da região. Em 1997, aumentou para 63,23%; depois, em 2007, para 70,29%; no ano de 2015, estava em 70,54%.
No mesmo período, a cobertura vegetal caiu praticamente pela metade: de 31,26% em 1986 para 16,63% em 2015. Em 1997, equivalia a 21,56% e, em 2007, a 17,02%. Quanto ao solo exposto, de 0% em 1986 e 1997, subiu para 0,004% em 2007 e 0,09% em 2015.
Ameaça aos rios – A sub-bacia do rio da Prata, uma das que compõem a hidrografia de Bonito, está inserida na bacia do Miranda, conforme explica Ângelo Rabelo. “A bacia hidrográfica do Miranda é composta de várias sub-bacias, como a do Prata, do Mimoso, do Perdido e do Aquidaban. E todas elas são muito utilizadas para o turismo”, menciona o coronel.
O desmatamento do município é ameaça para esses rios, provocando o assoreamento e o turvamento das águas.
A expansão de áreas desmatadas em Bonito tem chamado a atenção do MPE/MS (Ministério Público Estadual em Mato Grosso do Sul). Há pelo menos três inquéritos em andamento para apurar responsabilidades de proprietários quanto ao descumprimento da legislação ambiental.
Imagens de drones feitas pela PMA mostram largas áreas com lavouras engolindo a vegetação nativa. Essa situação ocorre, inclusive em locais de nascentes de rios. É o caso do Mimoso, que está cercado por lavouras em área onde deveria existir vegetação nativa.
Expansão de lavouras – De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), é expressivo o crescimento das áreas plantadas com grãos no município de Bonito nos últimos anos.
Em 2014, havia soja em 38,7 mil hectares. Essa área subiu para 46 mil neste ano. O incremento é de 18,86%. No mesmo intervalo, a área plantada em todo o estado com a oleaginosa cresceu 15,67%, de 2,3 milhões de hectares para 2,66 milhões de hectares.
A disparidade é maior no caso do milho. O IBGE mostra que a área plantada com essa cultura no município de Bonito era de 26 mil hectares em 2014. Neste ano, alcança 33 mil hectares, variação de 26,4%. Essa alta está seis vezes acima do aumento do espaço com lavouras do grão em Mato Grosso do Sul: subiu 6,23%, de 1,63 milhão de hectares em 2014 para 1,7 milhão de hectares neste ano.