Em paralelo à campanha presidencial, há consenso entre especialistas sobre a necessidade de tornar a cobrança de tributos mais simples, compensar os contribuintes mais pobres e restringir a concessão de isenções a empresas.
Ilustra essa convergência a aproximação entre as visões do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), organização não governamental brasiliense ligada a movimentos sociais, e o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), de Curitiba (PR), responsável pela elaboração do Impostômetro, referência constante entre empresários que reclamam da alta incidência de impostos no Brasil.
“Temos que tirar um pouco da tributação sobre o consumo e aumentar sobre o patrimônio e rendaâ€, defende Gilberto Luiz do Amaral, advogado tributarista do IBPT. “Isso vai fazer com que os produtos fiquem mais baratos, o que permite a lucratividadeâ€.
“A forma como a carga tributária é distribuÃda no paÃs incide muito mais sobre tributos indiretos que são extremamente regressivos - o que é muito prejudicial não apenas para a justiça social, mas para a própria economiaâ€, concorda Grazzielle Custódio, assessora polÃtica do Inesc.
As duas visões são acompanhadas pelo atual secretário da Receita Federal, Jorge Rachid. “Hoje, 48% de nossa carga é incidente sobre consumo. A pessoa na camada mais baixa de renda acaba tendo a renda mais comprometida com esse tributo do que acontece com uma pessoa de alta renda. Então, há necessidade dessa revisãoâ€.
Rachid assinala que, além de injusta, a tributação sobre consumo é extremamente complexa. “Chegamos ao ponto de ter legislação para duas ou três empresas que estão dentro de um setor econômico. Isso não é corretoâ€. Ele avalia que, assim como a regressividade dos impostos, a burocracia que se origina do excesso de normas é antieconômica. “A legislação está chegando em um ponto que está sendo prejudicial para o crescimento do paÃs. A necessidade da mudança passa a ser uma imposiçãoâ€.
A urgência também é apontada pelo Banco Mundial. A instituição multilateral estima que as empresas gastam 1.958 horas por ano e R$ 60 bilhões para vencer a burocracia tributária.
Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, contabiliza que o efeito da burocracia e do cipoal de normas é insegurança jurÃdica dos contribuintes e aumento de contencioso nos tribunais. Segundo ele, há em litÃgio mais de R$ 3,3 trilhões em disputas tributárias (processos administrativos, demandas judiciais e dÃvidas em execução). “É uma situação ruim, piorandoâ€, assinala.
Segundo ele, a própria Constituição Federal, com mais de 250 dispositivos tributários, é causa do volume do contencioso. “Cada um dos dispositivos pode ser questionado do ponto de vista constitucional. Significa dizer que desde o momento que a matéria tem decisão em primeira instância até que a matéria venha a ser encerrada em recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal leva de 15 a 20 anos.â€
Reforma e próximo presidente
Gilberto do Amaral, do IBPT, sugere que o novo presidente da República faça uma consolidação da legislação tributária e elimine 70% das burocracias e obrigações para pagar imposto no Brasil. “Se isso acontecer, os empresários vão dizer ‘graças a Deus. Até posso aceitar mais tributos, mas retire todo esse calcário que são as burocracias porque daà eu tenho mais tempo para vender, para comprar, para prestar serviços e tenho mais segurança no meu negócio’â€, acredita.
Além de enxugar normas e dar racionalidade ao sistema tributário, “o próximo presidente vai ter que enfrentar o desafio de revisão de benefÃcio tributário. Agora tem que encontrar no Congresso um ambiente propÃcio para esse debateâ€, aponta o secretário Jorge Rachid. “Ao ceder uma isenção fiscal, esse benefÃcio tem que ter análise, tem que ter um tempo certo, precisa ter uma polÃtica de governança, alguém responsável para fazer essa avaliaçãoâ€, recomenda.
A estimativa do relator da reforma tributária na Câmara dos Deputados, Luiz Carlos Hauly (PSDB), é de que ao todo as renúncias fiscais custem anualmente R$ 500 bilhões aos cofres públicos. Em muitos casos, são os próprios parlamentares que incluem normas para poupar empresas de pagar impostos.
O cientista polÃtico Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas (FGV), assinala que o excesso de interessados, incluindo 27 governadores que temem perder arrecadação, pode dificultar o andamento da reforma tributária, como ocorreu até hoje. “É a tragédia dos comuns. Se alguém perde, gera vetoâ€.